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sábado, 11 de junho de 2011

O bullying e os direitos da criança e do adolescente

Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso: O bullying e a responsabilidade civil do estabelecimento de ensino privado. Autor: Marcelo Magalhães Gomes


O Estatuto da Criança e do Adolescente positivou diversas garantias e medidas protetivas com o propósito de afiançar um desenvolvimento sadio aos infantojuvenis.

O comportamento discriminatório e agressivo dos bullies atenta acintosamente contra o respeito e a dignidade de suas vítimas ferindo os direitos estatutários transcritos abaixo:

Estatuto. Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.[...]. Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais. Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.

A violação de quaisquer desses direitos afeta a dignidade do infantojuvenil, incidindo, portanto, em dano moral. Sendo assim, as vítimas de bullying poderão contender judicialmente pelo devido ressarcimento, conforme orienta o Professor FÁBIO MARIA DE MATTIA:

O atentado ao direito à integridade moral gera a configuração de dano moral, que, no caso, será pleiteado pela criança ou adolescente através de seu representante legal. A indenização por dano moral não mais suscita dúvidas, é a consagração do dano moral direto, em face dos termos do princípio constitucional previsto no art. 5º, X, que dispõe: "São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação."

Mas, antes que o dano moral ao infantojuvenil efetivamente ocorra, temos o dever de comunicar essa iminência ao Conselho Tutelar que é o órgão - administrativo, municipal, permanente e autônomo - encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente.

O artigo 13 do Estatuto trata dessa obrigatoriedade de comunicação à autoridade competente no caso de conhecimento de maus tratos perpetrados contra crianças e adolescentes. Aqueles que não o fizerem incorrerão na pena prevista no art. 245:

Estatuto.Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de maus tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais. Art. 245. Deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de ensino fundamental, pré-escola ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente: Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.

Quanto ao contexto em que está inserido o artigo 13 no Estatuto, ROSSATO, LÉPORE e CUNHA comentam:

Vale ressaltar que apesar de alocado em meio a dispositivos que versam sobre o direito à saúde e obrigações dos profissionais dessa área, o dever de comunicação de maus tratos também se estende a outros profissionais, a exemplo de professores, responsáveis por estabelecimentos de ensino, dentre outros, conforme explicita a redação do art. 245 do Estatuto, que considera infração administrativa o descumprimento dessa determinação legal.

Mesmo porque, em se tratando de responsáveis por escolas de ensino fundamental – etapa de ensino onde, conforme pesquisa da PLAN BRASIL, se verificou a maior incidência de bullying - a lei foi específica ao tratar do assunto: "Art. 56. Os dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comunicarão ao Conselho Tutelar os casos de: I - maus-tratos envolvendo seus alunos;[...]."

Na cartilha lançada pelo Conselho Nacional de Justiça encontramos a seguinte orientação dada aos responsáveis pelos estabelecimentos de ensino nos casos de bullying:

A escola é corresponsável nos casos de bullying, pois é lá onde os comportamentos agressivos e transgressores se evidenciam ou se agravam na maioria das vezes. A direção da escola (como autoridade máxima da instituição) deve acionar os pais, os Conselhos Tutelares, os órgãos de proteção à criança e ao adolescente etc. Caso não o faça poderá ser responsabilizada por omissão. Em situações que envolvam atos infracionais (ou ilícitos) a escola também tem o dever de fazer a ocorrência policial. Dessa forma, os fatos podem ser devidamente apurados pelas autoridades competentes e os culpados responsabilizados. Tais procedimentos evitam a impunidade e inibem o crescimento da violência e da criminalidade infantojuvenil.

No entanto, na opinião do Procurador GUILHERME ZANINA SCHELB "a intervenção deve ser ponderada, na medida em que, se, por um lado, deve fazer cessar a humilhação, por outro, deve estimular na vítima do bullying a capacidade de autodefesa, evitando uma superproteção prejudicial."

Considerando o caráter multidisciplinar do tema em questão e a necessidade das escolas estarem preparadas para lidar com a questão, LÉLIO BRAGA CALHAU diz que:

Atualmente um grande número de escolas mantém em seus quadros pedagogos e psicólogos, que, em sendo chamados para ajudar, poderão contribuir muito com a solução dos problemas. A orientação deve nortear a ação desses profissionais. Chamar a polícia e o Ministério Público, a meu ver, somente nos casos mais graves. A solução, dentro do possível, deve ser conseguida compartilhando o problema com o grupo de alunos, tendo em vista que os alunos tendem a voltar a praticar os atos de bullying assim que se colocarem sem supervisão.

Sobre a atuação das escolas, também acrescenta o Professor NELSON JOAQUIM:

Cabe, também, às instituições escolares, se necessário, reprimir atos de indisciplina praticados por alunos e aplicar as penalidades pedagógicas nos casos previstos no regimento escolar ou interno. Entretanto, deve esgotar todos os recursos sociopedagógicos a ela inerente, inclusive ter uma equipe especializada de profissionais, como psicopedagogos e profissionais afins, para atuar de forma preventiva nos distúrbios ou problemas de aprendizagem.

Porém, sendo inócua a tentativa de resolver o problema diretamente com os alunos e esgotadas todas as possibilidades pertinentes ao caso concreto "é o caso de acionar o Conselho Tutelar e o Ministério Público." complementa LÉLIO BRAGA CALHAU. Ao final, acrescenta o eminente Promotor que "embora a polícia possa participar hoje com grupos de acompanhamento escolar, chamar a polícia pode assustar demasiadamente os alunos e provocar o retraimento, o que dificultaria qualquer medida negociada."

Finalmente, gostaríamos de destacar que, antes que seja necessário o acionamento das autoridades competentes, a prevenção sempre será o melhor a ser feito pelos estabelecimentos de ensino. As escolas têm feito isso através de programas ou campanhas esclarecedoras sobre o tema.

Considerando que o bullying é uma realidade nas escolas do nosso país, encerraremos este artigo com um programa de intervenção escolar criado pelo professor Dan Olweus que é referência internacional. Esse programa tem sido implementado preventivamente em diversas escolas pelo mundo. Resumidamente, o programa tem as seguintes propostas:

Requisitos prévios gerais: Consciência e implicação.

Medidas para aplicar na escola: estudo de questionário; jornada escolar com debates sobre os problemas de agressores e vítimas; melhor vigilância durante o recreio e na hora da alimentação; zonas de descanso da escola mais atrativas; telefone para contato; reunião de pais e funcionários da escola; grupos de professores para o desenvolvimento do meio social da escola; círculos de pais.

Medidas para aplicar em sala de aula: normas da classe contra agressões: clareza, elogio e sanções; reuniões de classe regulares; jogos de simulação, literatura etc.; aprendizagem cooperativa; atividades de classe comuns positivas; reuniões de professores, pais e alunos da classe.

Medidas individuais: falar seriamente com agressores e vítimas; falar seriamente com os pais dos envolvidos; uso de criatividade por parte dos professores e pais; ajuda de alunos "neutros"; ajuda e apoio para os pais (cartilhas para os pais etc.); grupos de debate para pais de agressores e de vítimas; troca de turma ou de escola.

Ao prevenir, os estabelecimentos de ensino estarão em consonância com o prudente artigo 70 do Estatuto da Criança e do Adolescente que institui: "É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente."

BIBLIOGRAFIA

CALHAU, Lélio Braga. Bullying: o que você precisa saber: identificação, prevenção e repressão. Niterói, RJ: Impetus, 2009.

CNJ. Bullying – Projeto Justiça nas Escolas. Cartilha 2010. Disponível em: Acessado em 30.Out.2010.

FANTE, Cléo. Bullying Escolar: perguntas e respostas. Disponível em: Acesso em: 30.Out.2010.

JOAQUIM, Nelson. Direito Educacional Brasileiro. História, Teoria e Prática. Rio de Janeiro: Livre Expressão, 2009.

NETO, Aramis A. Lopes. Bullying - comportamento agressivo entre estudantes. Disponível em: Acesso em: 01.Nov.2010.

PLAN BRASIL. Pesquisa: Bullying no ambiente escolar. Brasil. 2009. Disponível em: Acessado em: 01.Nov.2010.

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